[as sagradas entrelinhas] - elienai cabral jr.

A pretensão piedosa de muitos cristãos de se apoiarem peremptoriamente no que dizem as Escrituras é no mínimo ingênua. Partem do pressuposto impensado de que há uma compreensão absoluta do que está escrito. Que por sua vez funda-se na idéia de que a verdade seja algo pronto, do lado de lá do pensamento, grafado no texto bíblico, apenas à espera que pessoas dela tomem posse.

A compreensão da verdade pensada assim elimina a mais humana das ações: a interpretação. Somos todos seres de interpretação. Uma vaca não interpreta, apenas reage. Uma pessoa não reage apenas, interpreta. Não há possibilidade de haver uma ação humana sem que também aconteça uma interpretação. Uma verdade nunca está do lado de lá pronta para ser possuída. Toda apreensão de idéias é um movimento impreciso e participativo de interpretação.

As páginas da Bíblia não são gavetas que guardam verdades, mas a coleção de narrativas e dissertações que nos convidam ao aprendizado. Nem seus leitores são desengavetadores inertes e neutros de conteúdos prontos. A Bíblia é um livro forjado com múltiplas interpretações. Desde sua escrita original, traduções e versões, o texto é marcado pela confluência de mentes que dela participaram. Juntamos a isso as teologias, tradições e culturas que têm na Bíblia ao menos uma referência de valor e temos um mundo indeterminado de olhares em suas páginas. Porque simplesmente é impossível à mente humana ler sem interpretar e interpretar sem entrar em conflito com outras e diversas interpretações.

Quem quer que afirme apoiar-se absolutamente no que dizem as Escrituras está na verdade dizendo que se apóia em uma tradição de pensamento e do que dela compreende.

O que chamamos de verdade bíblica é uma miragem. Porque não há possibilidade de existir um conteúdo de afirmações atemporal e universal. Por tudo o que já se disse acima. Ao entrar em contato com uma afirmação coloco em movimento todos os preconceitos, tradições, sentimentos, aspirações do meu tempo, questões da minha época, tudo o que em mim participa do modo como interpreto a vida e as pessoas à minha volta. A verdade é relativa a mim, e tudo o que em mim participa do que compreendo. A verdade é necessariamente provisória. Está sempre em construção.

O que chamo de verdadeiro não é um bloco maciço de idéias, mas um corpo inacabado e dinâmico de perspectivas. As verdades humanas nunca são absolutas, são sempre finitas e processuais. Qualquer outra candidata à verdade que se pretenda completa, universal e insuperável pelo tempo fala uma língua incompreensível à mente humana. Nada comunica. Não nos diz respeito. Nem dela podemos fazer referência. Se nos referimos a uma idéia, interpretamos.

Isso significa que sempre que alguém arroga para si a posse de uma verdade absoluta está de fato absolutizando uma versão, a que prefere os interesses de quem está acomodado ao que prevalece em seu mundo. A história não deixa dúvidas sobre os absurdos já cometidos em nome da posse inquestionável da verdade. Mas certamente o maior dos absurdos é a desumanização de todos que entram em contato com tal pretensão. Na medida em que uma idéia é absolutizada, as pessoas são pulverizadas. Quem sai em defesa da posse da verdade perde o outro de si mesmo, ou seja, a sua própria consciência e suas reivindicações por novas respostas. Perde também o outro além de si, ou seja, tudo e todos ao seu redor que divergem em busca do diálogo.

Quem quiser encontrar a Palavra de Deus e não perder a si mesmo e aos outros sob a prepotência de posse absoluta da verdade precisará ir além do que está escrito. Precisará abrir-se para fundir horizontes. De quem escreveu, da tradição e os de seu tempo. Precisará de modéstia para as alteridades envolvidas no texto. Precisará de compromisso com o seu mundo e suas dores. Precisará de imaginação e delicadeza.

Porque a Palavra de Deus não é a Bíblia, mas as suas entrelinhas.

Elienai Cabral Junior

essa é boa 2

Levi Nauter


É saudável o uso de silicone no seio da igreja?



[estou no meu limite] - ricardo gondim

Sei que existem pessoas sérias entre os evangélicos. Estou consciente de que mais de sete mil profetas ainda não se dobraram a Baal. Não esqueço o nobre testemunho dos que me precederam na militância da fé. Mas sinceramente, não dá...

Não dá para ver o avanço de vigaristas e charlatões prometendo cura divina, prosperidade financeira, solução de problemas conjugais, em troca de ofertas. Não suporto assistir a três minutos de programa de rádio ou de televisão. Sinto náusea com a postura arrogante de falsos profetas que oscilam entre camelôs religiosos e doces professores de Bíblia.

Não dá para lidar com a falta de responsabilidade humana dos fundamentalistas que celebram desastres naturais como sinais inequívocos do pecado ou do fim do mundo. Não tenho mais estômago para ouvir professores de teologia, forjados em seminários de segunda linha, criticando livros que nunca leram ou teólogos que não conseguem citar duas obras. Tenho medo quando discursam na defesa da “reta doutrina”.

Não dá para lidar com a inveja de sacerdotes que voam como abutres à espera de que alguém tropece. O mundo evangélico está repleto de líderes que jamais conseguiriam sobreviver no mundo empresarial, mas vivem de condenar os outros. Preguiçosos e despreparados, adoram praticar tiro ao alvo. Incompetentes, carregam a marca de Caim. Os piores, mimetizam comportamentos moralistas, copiam afirmações heterodoxas e se especializam na defesa das tradições denominacionais.

Não dá para lidar com o ufanismo das falsas onipotências. Na corrida pelos primeiros lugares no Olimpo dos ungidos, sobram narcisistas. Não agüento as empreitadas mundiais, os projetos, as campanhas, que “vão mudar o mundo”. Esses falsos heróis instumentalizam o povo em nome de suas megalomanias. Usam e abusam da boa-fé de quem quer fazer alguma coisa pela humanidade. Só que os recursos doados com sacrifício acabam diluídos na máquina, sugados pela volúpia de poder e investidos em mais propaganda para alardear como são especiais.

Não dá para lidar com a repetição enfadonha de chavões. Cansam as frases prontas, os conceitos batidos e repetidos, que já não transmitem valor algum. A grande maioria dos púlpitos evangélicos é de uma mesmice estupidificante. Os hinos reciclam poesias gastas; os sermões começam e terminam com a promessa de bênção.

Já escrevi que andava cansado com o meio. Já pedi para não ser classificado como “evangélico”. Agora não sei mais o que dizer. Talvez precise continuar batendo na mesma tecla, não dá, não dá, não dá...

Soli Deo Gloria.



Estou contigo nessa, pastor Gondim. Talvez minha vantagem seja eu não ser pastor. Levi Nauter

essa é boa

Levi Nauter




Quem aspira as coisas do alto está limpando o teto de casa?


FONTE: www.verticontes.blogspot.com

[encantada, engasgada, engatada] - levi nauter

Levi Nauter





Durante minhas férias de julho (duas semanas) assisti a um filme no mínimo curioso. Dos estúdios Disney, a história é um conto de fadas na grande metrópole. Giselle é expurgada de seu reino pela malvada rainha. Onde vai parar? Obviamente, como um típico filme norte-americano, cai na Times Square. A partir daí, temos um desfile por belos lugares de Nova York. Um bem apessoado advogado acolhe a menina. Obviamente, também, ela não consegue resistir ao charme do homem.

Mas preciso dar uma dica: não assita ao filme dublado. A música, de estilo caribenho, parece ter sido gravada pela estridente (e chata) voz da Ana Paula Valadão. Era-me bastante irritante ter de ouvir, de quando em quando, o “asim ela sabe que a ama...”. Parecia o tal Diante do Trono. Mas o filme é divertido, nada que o 'subtitle' não resolva. A música – em inglês – torna-se mais audível, machuca menos o ouvido, há menos miação.

No elenco, a princesa é Amy Adams; o advogado, Patrick Dempsey; a malvada é a já velha Susan Sarandon.

Ah, o filme. Chama-se Encantada.



[tipologia cristã 2]

Mais uma do Verticontes, o Wilson T. está demais. Rir não faz mal a ninguém. O texto vem a calhar, acabo de construir e sei o que o texto propõe.



No canteiro de obra:

crente prego-sem-cabeça: edifica, mas não aparece.
crente furadeira: só dá furo e ainda faz muito barulho.
crente metro-de-bambu: útil em áreas de tensão.
crente martelo: pregador por vocação, mas faz estrago quando erra na introdução.
crente martelo-de-borracha: agride, mas não machuca.
crente grifo: aperta, mas não amarra nada.
crente prumo: é bem certinho, mas se pegar no pé de alguém...
crente bucha: segura as pontas, mas abre o bico.
crente lixa: áspero, mas acaba com as farpas maldosas.
crente arame farpado: se você bobear ele puxa teu saco.
crente peroba: pau pra toda obra.
crente trena: vive medindo o outro.
crente serrote: adora uma divisão.
crente andaime: dá apoio, mas é um perigo.
crente prego de aço: não se dobra facilmente, apesar das porradas do pregador.
crente corrente: amarra o pastor.
crente textura: dá jeito em fachadas.
crente betoneira: não deixa a massa parar.
crente guindaste: se orgulha de levar as cargas.
crente cano: vive escondido, mas quando deixa vazar algo dá um broblema...
crente válvula-hidra: limpa a sujeira, mas não apaga a lembrança.
crente tijolo-baiano: todos acham feio, mas são os mais usados.
crente caçamba: é paradão, mas muito útil.
crente chave-de-fenda: penetra nas brechas.
Crente cal virgem: dá um ar de limpeza, mas não resiste muito.
crente pá-de-pedreiro: gosta de alisar as massas... Mas também a joga.





rebanho apostólico - de Volney Faustini

Com a devida autorização, posto um texto bem criativo do Faustini, um cristão que também não se conforma com o que está por aí. Em seu texto não há mera coincidência. Reflitamos.

Para encontrar Faustini, digite: http://volneyf.blogspot.com. Vale a pena!


REBANHO APOSTÓLICO


Preacher: Diga à pessoa do lado: Eu te amo.
Povo: (burburinho) eu te amo ... (burburinho) eu te amo ...
Preacher: Mesmo que voce não conheça quem está ao seu lado, diga eu te amo,
Povo: (burburinho) eu te amo ... (burburinho) eu te amo ...
Preacher: Povo apostólico!
Povo: Amém!!
Preacher: Voces não se deixarão ser levados por ventos de doutrinas estranhas.
Povo: Amém !!
Preacher: Porque vocês são a pérola preciosa - a pérola apostólica!
Povo: Amém ! !
Preacher: Voces não deixarão de ser fiéis, de ser o escolhido, de ser o abençoado.
Povo: Amém ! !
Carinha lá no meio: A L E L U I A.
Preacher: Porque voces tomaram posse. Bata o pé com firmeza no chão - esta é a terra e o tempo que Deus lhe deu. O tempo gente, não o templo.
Povo: (burburinho e batida no chão) [pá, pá, pá] Amém!
Preacher: Voces não se deixarão abater pelas provações apostólicas nem pelas perseguições do inimigo. Vocês e só vocês pisarão na cabeça da serpente.
Povo: (burburinho e batida no chão) [pá, pá, pá] Amém!

Preacher: Não aceitaremos injustiça - mesmo que as provações não tenham explicações ou justificativas plausíveis! Amém?
Povo: Amém ! !
Preacher: Podem se assentar... Vocês são nação apostólica. Repita comigo: Eu sou único, eu sou singular, eu sou um indivíduo!
Povo: Eu sou único, eu sou singular, eu sou um indivíduo!
Preacher: Não me deixarei ser levado por ventos de doutrinas outras.
Povo: Não me deixarei ser levado por ventos de doutrinas outras.
...

Preacher: Agora que terminou a lavagem apóstolica dos meus pés, venham beber dessa água ungida.
Povo: (em fila) glub glub glub
Preacher: Amém ?
Povo: Amé ... cof, cof ... mém



[jesus] - Pedro Luis e a Parede com Ney Matogrosso

Essa é uma obra típica da nossa brasilidade. Viva o povo brasileiro. Viva a arte!

Aristóteles já dizia que deveríamos "brincar para ser sério". De minha parte, penso que a visa sem riso é sem graça.

A composição a seguir é coletiva, de Gustavo Valente, Lucas de Oliveira, Dado, André Passos, Rodrigo Cabelo, Beto Valente E Pedro Luís. O suingue é maravilhoso - essencialmente o contra-tempo muito bem executado pela percussão. As vozes do sempre bom Ney e a bela interpretação poética do Pedro Luís dão o toque magistral para a música. Mas a leitura da poesia também é importante. Leiamos, então, Jesus:


Salve, salve, simpatia!
Dizem que Jesus morreu na cruz
mas eu tive com ele na Dutra, em Queluz
levava na cabeça um tabuleiro de cuscuz
cocada de céu, cocada de luz
cocada de céu, cocada de luz
cocada de céééuuu...

Jesus
Jesus, Jesus
Jesus

Galo cantou
Jesus
Pneu furou
Jesus
Vestibular
Jesus
Atravessar o mar
Moisés
Sobre as ondas com os pés
Jesus
Como Jojó de Olivença
Zulu

No mar da África do Sul
No mar da África do Sul
No mar da África

Jesus, Jesus...

Fazenda do Seu Jesus
Fazenda do céu, Jesus

Tem cachoeira
Fonte de água viva
Também faz sol
Chuva quando precisa
No São Francisco
piracemas de alegria
Belém-Brasília
feijãozinho da Dona Maria.

Jesus, Jesus...

Tatu andou
Jesus
Tatuapé
São Paulo
Bicho pegou
Noé
Bicho de pé
Jesus
Faltou a luz

Jesus, Jesus...

Jesus, Jesus
Vamos tirar Jesus da cruz
Vamos tirar, vamos tirar
Vamos tirar Jesus da cruz

Nós vamos tirar Jesus da cruz
porque o rapaz está pregado
naqueles pedaços de pau
há mais de dois mil anos
Vamos deixar ele com os pés
e as mãos livres
que ele vai pular, dançar
virar cambalhota
e fazer muito melhor.
Mas é muito melhor!

E vai no lombo do cavalo
galopando pelo espaço
Salve a agricultura celeste

Salve a agricultura celeste
(Salve a agricultura celeste)
Salve Jorge, salve simpatia!
(Salve a agricultura celeste)
Salve Mané Garrincha
e Clementina de Jesus
(Salve a agricultura celeste)
Salve Chico Science
e Chico Xavier
(Salve a agricultura celeste)
Salve Raul Seixas
e Chacrinha, o Velho Guerreiro
(Salve a agricultura celeste)
E paz na Terra
a todos os seres
(Salve a agricultura celeste... )


meu jardim

meu jardim
minhas flores

minha alegria

minha alegria
Maria Flor

Sobre este blog

Para pensar e refletir sobre o cotidiano de um cristianismo que transcende as quatro paredes de um templo.


"Viver é escolher, é arriscar-se a enganar, aceitar o risco de ser culpado, de cometer erros" [Paul Tournier]

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LEVI NAUTER DE MIRA, doutorando em educação (UNISINOS), mestre em educação (UNISINOS) e graduado em Letras-português e literatura (ULBRA). Tenho interesse em livros de filosofia, sociologia, pedagogia e, às vezes, teologia. Sou casado com a Lu Mira, professora de História, e pai da linda Maria Flor. Adoramos filmes e séries.

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  • PROIBIDA A ENTRADA DE PESSOAS PERFEITAS, de John Burke
  • OS DESAFIOS DA ESCRITA, de Roger Chartier