sobre Fred Hammond - Levi Nauter

Levi Nauter


No texto “em off” citei Fred Hammond, baita cantor, compositor e instrumentista.

Nesta quarta-feira, dia 01-10-08, resolvi rever um DVD que possuo dele. Foi um dia muito especial. Deus parecia estar literalmente dentro da minha casa. Que coisa maravilhosa. Chorei como poucas vezes vendo um DVD cristão.


Para meu alívio, na música que mexeu comigo, Hammond fez um comentário antes de cantar a bela música Simply Put. Para de falar e, a seguir, transcrevo partes de sua fala e um trecho da sua composição. O texto “em off”, guardadas as devidas proporções, tinha a mesma intenção, felizmente notada pela maioria dos que me leram.



“...num ponto da minha caminhada eu me cansei da igreja. Não me cansei de prosseguir nem de Deus. Eu cansei de ver sempre as mesmas coisas (...). Cansei de usa as escrituras como 'abracadabra!'. Só queria que algo real acontecesse. Às vezes temos o Mar Vermelho, mas ele não se abre.

E meus amigos religiosos não gostam que eu diga isso...

Mas Deus tem sido bom.

Estou cansado destas coisas complicadas. Há três coisas que quero saber de fato"


Leiamos a música:


Eu não preciso prever o futuro de alguém

Não preciso ver coisas que não podem ser vistas

Não preciso de outro encontro avivado na igreja

Ou outro tema inteligente para o ano novo

Não estou buscando outro sermão de arrepiar

Ou uma palavra que me faça desfalecer

Minhas necessidades básicas são muito simples:


Saber que tu me amas, que gostas de mim e que sou teu


(...) Preciso da clareza e da simplicidade do que é real

Prefiro apenas expressar como me sinto...


Encontrei o maior presente embalado na Salvação

É muito mais simples do que parece...

Deixo de lado a minha cultura sacra

Pois, quando morrestes, respondestes a todas as dúvidas; dissestes que:

me ama, gosta de mim e sou teu.



Trata-se do DVD Free to worship. A música citada acima pode ser ouvida no link:

http://www.youtube.com/watch?v=9gC1i7QA9gE


Escutem, depois comentem.





essa é boa 4



Se um pastor não prega direito sua mensagem cai?







Fonte: http://www.verticontes.blogspot.com






[em off] - levi nauter

Levi Nauter



Qualquer canção de amor
É uma canção de amor
Não faz brotar amor e amantes
Porém, se esta canção
Nos toca o coração
O amor brota melhor e antes

Chico Buarquei




Muito gostei de ouvir a música gospel dos corais e cantores negro-norte-americanos. Na minha estante, alguns nomes contam essa história. Lá, empoeirados, estão Fred Hammond, Yolanda Adams, Kirk Franklin, Bebe e Cece Winams, Mount Moriah Mass Choir, The Brooklyn Tabernacle Choir, entre outros. Nessa época, para mim, cantar bem tinha a ver com a gritaria, com o estardalhaço, com o virtuosismo, com a pedância em repetir um mesmo estribilho. Bons foram aqueles tempos, mas já passaram.

Em seguida tive a fase, digamos, mais branquela. Cristal Lewis e Sandi Patti eram ícones. Outra vez a gritaria reinava, essencialmente com a Patti cantando a enlouquecida Via dolorosa. Era coisa de cortar os pulsos, o que sempre me deu medo. Por sorte não havia armas em casa.

Na seqüência, descobri o worship. Outra febre. Comecei ouvindo o sóbrio Joseph L. Carlington; passei pelo Don Moen e seu Celebrate, não esqueci o Kenoly nem a versão tupiniquim representada pelo Adhemar de Campos. Nessa mesma época, tudo o que se fazia na América e se traduzia por aqui era como se tivesse caído direto do céu.

Depois foi o rock cristão. A sina da cópia foi a mesma já relatada. A linguagem da América era como se fosse a língua dos anjos.

Minha incursão pela literatura cristã percorreu o mesmo caminho. Caminho estúpido. Lembro-me do medo causado por um livro no qual se chamava Mikail Gorbachev de anticristo. Li Steven Lawson, Benny Hinn; Rebecca Brown, entre outras tristes pérolas. Dentre as minhas atuais decepções está o Max Lucado.


Minha vida mudou completamente. Hoje, aos trinta e quatro anos, sou completamente diferente dos que só me conheceram nos anos oitenta ou noventa.


Qualquer canção de bem

algum mistério tem

É o grão, é o germe, é o gen da chama

E essa canção também

Corrói, como convém,

O coração de quem não ama.

Chico Buarque


De repente eu, que fui tão protegido do mundo, descubro o mundo. Que mundo maravilhoso. Descobri que havia MAIS perto de mim do que a minha vã filosofia, do que a minha pouca visão de mundo. Na medida em que começava a incomodar o norte-americanismo, começava a conhecer o Brasil. Conheci o Grupo Logos, o Milad, o Sinal de Alerta, o Rebanhão (que alguns idiotas insistiam na mensagem subliminar). O Sergio Pimenta, o João Alexandre, o Jorge Camargo. Opa, isso tudo feito por crentes? Estarrecedoramente a resposta era sim. Na escrita, descobri o Paulo Romeiro, o Ricardo Gondim, entre outros ousados.

Adiante na minha criticidade, comecei a desconfiar dos que falavam mal do Renato Russo (não só por sua opção sexual) e do Raul Seixas. Fui ouví-los. Que bênção! Que descoberta ótima.

Passei a desconfiar dos discursos igrejeiros que ouvia.

Casei. Fui para a faculdade. Tornei-me professor. Adquiri casa própria. Aumentei consideravelmente meu leque de leituras e audições musicais. Descobri autores não cristãos: Kafka, Saramago, Dostoiévski, Graciliano, Cony, Lispector, Machado, Cecília, Adélia. Conheci outros tons: Zé Keti, Lupicínio (meu conterrâneo), Elis, Chico (nem precisava dizer), Teresa Cristina; Madonna, M. Jackson, George Michael, Lauryn Hill, Nirvana – entre muitos e muitos outros. Encontrei-me com os escritores do mal e com a música mais underground. Começava a entender por que as instituições religiosas odiavam alguns desses que acabei de citar. Percebi que as amizades – dentro ou fora da instituição – continuavam intocadas. Notei que Deus não me abandonara. Observei que “a língua dos anjos” estava mais para inglês do que espanhol ou português e que, apesar disso, Deus estava firme e imutável em se revelar pra mim via Borges, Márquez, Neruda.

Lendo ou ouvindo os nomes recém citados era-me (e ainda é) perceptível uma nuance do divino, de estética.

Passei a desconfiar ainda mais dos discursos igrejeiros que ouço. O que fazer? Tomar decisões.

Porém ainda é melhor
Sofrer em dó menor
Do que você sofrer calado.

Chico Buarque


Na idade em que estou acho que posso usufruir de alguns luxos. E assumo-os com possíveis riscos que daí advenham – inclusive o de 'torrar' no inferno.


Já passou, já passou
Se isso lhe dá prazer
Me machuquei, sim, supurou
Mas afaguei meu peito
E aliviou
Já falei, já passou

Chico Buarque





Pelo menos por hora, desisti de ficar 'perdendo tempo' discutindo doutrina, visão de igreja, de denominação ou, pior, minha cosmovisão cristã. A razão é que, em geral, quem se envereda nesse caminho quer me convencer de que estou errado, de que tenho de mudar. Portanto, o que penso sobre cristianismo penso e pronto; meu pensamento é o “de experiência feito” - no dizer do mestre educador Paulo Freireii. Continuando com ele, preciso imediatamente dizer que cheguei num ponto da vida em que “a minha fé não me faz cínico, ela me faz indignado”. Mas não uma indignação acrítica.

Desisti de ter pressa. Agora moro numa cidade mais tranqüila, ando mais a pé. Se perco um ônibus espero o próximo ouvindo música ou lendo um livro. A correria só aumenta meus batimentos cardíacos. Pobre, levei treze anos para adquirir a casa própria; só agora serei pai. Cansei de esperar ansiosamente a volta de Cristo. Quero que Ele venha, mas sem pressa. Enquanto isso, fico por aqui, às vezes brincando, às vezes tentando crescer, às vezes tentando melhorar o mundo. Desisti de salvá-lo.

Desisti de ouvir rádio e olhar programas de televisão cristãos. Na verdade, tenho fugido de tudo que tenha a palavra gospel ou cristã. Não quero enriquecer nenhum líder de qualquer coisa em nome da obra de Deus. Tampouco ficar ouvindo receitas de como receber mais de Deus, como ser desesperado por Ele, apaixonado por Ele. Estou de saco cheio de tirar o pé do chão sem cair. Chega dessa palhaçada. Prefiro ler os chatos Lair Ribeiro e Roberto Shinyashiki a ouvir um sermão baseado muito mais neles do que na sempre ótima Bíblia. Lair e Roberto pelo menos sabem fazer o que fazem. Os 'preletores' são como vacas, ficam ruminando para, depois, regurgitar na boca de uma massa preguiçosa.

Desisti de entrar em livrarias evangélicas. Prefiro a Livraria Cultura, a Saraiva. Não é pelo marketing mas, sim, pela possibilidade de comprar uma obra melhor. Entre ouvir o Michael Smith e o Toque no Altar cantando a chata “Faz chover” prefiro as múltiplas versões da linda “Ave Maria no morro”. Tem muito mais a ver com a minha vida, com o meu cheiro, com a terra na qual Deus me permitiu nascer. Ocorre que a Ave Maria no morro não foi feita no norte, mas no sul. Então parece – para alguns – mais feia, menos divina. Pra mim não.

Desisti, por essas e outras, de 'bater o ponto' num templo. Tenho optado por compartilhar da vida com os poucos amigos. Tomar um belo café com minha mulher (de quem não sou dono) e futura mamãe. Dar um passeio pela rua ouvindo o canto dos pássaros. Ouvir um Zeca Baleiro, um Baden Powell, um gaudério como Vitor Ramil ou os conterrâneos César Oliveira e Rogério Melo. Tem sido maravilhoso descobrir As cidades invisíveis, do outro Calvino. Tenho refletido quando canto o Hino Rio-Grandense. E tem sido muito desafiador demonstrar Cristo tanto para os meus alunos da EJA como para os meus vizinhos. Ser sal num lugar onde a igreja tem sido açucar não é fácil. Desvencilhei-me. Basta de instituição.

Desisti de ter medo de Deus. Não é isso que Ele quer de mim. Ele quer que eu seja eu.

Já não tenho medo do inferno (o que é esse mundo muitas vezes?). Também não fico ruborizado quando me dizem que “Deus vai cobrar”. Muito menos sigo os conselhos dos legalistas de plantão, aqueles que se acham maduros demais na fé ou que já alcançaram um certo patamar de santificação espiritual que estão de “corpo fechado”. Ignoro os tapadores de furos, aqueles que se acham a espuma das brechas (abriu a brecha?).

Deixem-me viver em paz e escrever o que bem quiser.

Ah, estou bem. Amo a mulher que tenho e a criança que estará conosco lá pelo final de abril/2009. E porque sou humano sou imperfeito, tenho relacionamentos a melhorar; sou cheio de defeitos. Sou chato, tenho um jeito ranzinza.

Mas tenho uma certeza que me conforta: não há nada que eu possa fazer para que Deus me ame mais, ou menos. Essa é a razão de eu estar vivo. Ele me ama!!!


Recolha o seu sorriso
Meu amor, sua flor
Nem gaste o seu perfume
Por favor
Que esse filme
Já passou

Chico Buarque





iAs citações do Chico Buarque são das maravilhosas músicas “Qualquer canção” e “Já passou”.

iiFREIRE, Paulo. Pedagogia dos sonhos possíveis. Ana Maria Araújo Freire (org). São Paulo: Editora UNESP, 2001.

O segredo de agradar a Deus - gondim

Ricardo Gondim


Portanto, vá, coma com prazer a sua comida e beba o seu vinho de coração alegre, pois Deus já se agradou do que você faz – Eclesiastes 9.7.




José Fulano de Tal morreu ontem. Pobre homem! Consciente dos seus deveres, nunca atrasou no relógio de ponto. Jamais perdeu um trem. Era impensável que acelerasse no sinal amarelo. Correto, pagou todas as suas prestações na data exata. Vestiu a mesma camisa até puir o colarinho. Sempre elegeu o candidato que votou. Leu o jornal diariamente. Teve um enterro comedido, sem muita emoção, parecido como a sua existência.

José Fulano de Tal foi assíduo membro de uma igreja. Submeteu-se aos regulamentos e exigências de sua religião - seu maior desejo na vida era agradar a Deus. Trabalhou incansavelmente nos mutirões do bairro. Contribuiu com entidades filantrópicas. Em sua última jornada, os amigos, parentes e curiosos caminharam circunspetos pelas alamedas do cemitério. Despediam-se de um homem que não conseguiu viver.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta gostar, mas gostar mesmo, de poesia. No poema, a palavra ganha ritmo para sincronizar-se com o pulsar do universo. E nessa magnífica, porém silenciosa palpitação, ressoa a voz do Divino.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta achar tempo para ouvir música. Quando melodia e rima se acasalam, nasce a sublime sonoridade do Paraíso. O Pai Eterno sorri quando seus filhos se aquietam para escutar os artesãos dos salmos, dos noturnos, das toadas, dos réquiens, das cantatas, das óperas, das polcas, do samba, dos hinos, dos recitais, dos corais, do jazz, da bossa-nova.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta amar os livros. É prazeroso para Deus, ver os filhos transcendendo para mundos imaginários através da prosa, da narrativa. Os romances dissecam a alma humana, enaltecem a virtude, expõem a crueldade e quando não sofrem censura, descrevem a realidade crua da vida.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta transformar cada refeição em um ágape, cada aperto de mão em uma aliança e cada abraço em uma declaração de amor.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta deixar-se conduzir por um vento desatento, rumo ao horizonte inatingível; e esperar por um porvir insubstancial. Já que Deus gosta de prados selvagens e de matas sem cercas, viver é arriscar-se. Deus sabe desenhar o arco-íris com as gotas do ribeiro que despenca no precipício. Portanto, só vive quem não teme esvaecer.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta gostar de vinho, de doce de leite, de tapioca com manteiga, de filme de amor, de esporte, de meia hora de sono extra no feriado, de bolo de milho, de cafuné, de beijo, de viagem de férias com dois dias sobrando para descansar do descanso.

José Fulano de Tal deveria ter aprendido que para viver, basta chamar Deus de Pai ou de Mãe.


Soli Deo Gloria.



via www.ricardogondim.com.br

Gondim, na minha opinião, é uma dessas cabeças que confortam cristãos cansados de igreja (instituição) e deixam em polvorosa os urubus disfarçados de pastores, bispos, apóstolos, semi-deuses e qualquer dessas alcunhas criativas.



[acredito em deus?] - resenha

Levi Nauter



Acabo de ler um livro que recomendo sem reservas.

Afora o parco investimento na qualidade do acabamento da obra (mal cortado, a colagem do miolo é quase nada – descola facilmente) o texto supera e faz mea culpa. Assim é Perguntaram-me se acredito em Deus, de Rubem Alves, publicado em 2007 pela editora Planeta. Também é necessário dizer que não há nenhuma novidade ideológica expressa na obra. Quem acompanha Alves e é leitor não-gramatiqueiro, mas exigente, antecipadamente poderia prever o que leria nas páginas.

A importância dessa obra está na divulgação de um outro Deus. Aquele sem gaiolas, aquele com o qual se pode brincar, com quem se pode discordar, chorar e oferecer poesias. Igualmente está na provocação. O lado psicanalítico do autor como que pega uma vara (instrução bíblica, aliás) e cutuca os cristãos fundamentalistas, chamando-os de religiosos e não de fariseus. Poeticamente Alves chama sua própria obra de mosaico, de sonata, de altar. Particularmente, prefiro dizer que Perguntaram-me... é um compêndio de textos que anunciam e denunciam.

Tenho a impressão de que, na iminência de ser pai, essa obra deveria ser contada aos filhos com toda a entonação e sensibilidade que uma hora do conto exige. A ousadia do velho Rubem é de dar inveja, santa inveja. Seus pitacos fogem da tradição, exibindo uma liberdade de quem tanto sabe o que está dizendo devido as ranhuras do tempo. Quero contar as 'estórias' para meu filho ou minha filha que está a caminho.


A primeira ousadia da obra está em, belamente, dizer que a Bíblia é “um livro cheio de cacos” (p. 16) e que cada religião é “um jeito de ajuntar os cacos” (p. 17). Outra bela atitude do autor foi criar o Mestre Benjamin. Este é quem diz tudo. Ele é o alter ego do autor. Benjamin salva o Rubem da execração; é uma espécie de advogado divino nesta obra. Entreverado está Deus, o Senhor das Histórias. A paráfrase de textos bíblicos foi outra bela sacada.

Já é uma ousadia misturar poetas seculares num livro que se propõe falar sobre Deus. Mais ainda foi convidar a Emily Dickinson, que sai arrebentando:


Alguns guardam o Domingo indo à Igreja -

Eu o guardo ficando em casa -

(...)

Assim, ao invés de chegar ao Céu,só no final -

eu o encontro o tempo todo no quintal.” (p. 27)


Achei isso maravilhoso. Parece-me o novo contexto religioso sendo como que profetizado pela Dickinson.

O texto “o abraço de amor”(pp. 31-34) quase exige que leiamos as declarações de amor, registradas em Cantares, ao som do Bolero – de Ravel. Que experiência estética! Aliás até o texto XI é isto que acontece: o autor nos carrega para uma experiência estética. A partir do XII, além de continuar com a beleza, há as denúncias. A primeira: Deus não possui um livro no qual contabiliza débitos e créditos. A segunda: o bom samaritano representado por um travesti. A terceira: a oração egoísta. A quarta: faíscas do cuidado ambiental. Quando observamos os textos que se seguem ao XVIII lemos anúncios: sobre tornar-se criança, sobre ser feliz, sobre orar, sobre sabedoria e sobre o amor. No amor tudo se encerra, inclusive o texto do Rubem Alves.

É por isso que fica difícil acreditar que “Deus tem uma câmara de torturas chamado inferno, onde tranca seus desafetos por toda eternidade...” (p. 102), essencialmente quando se lê a síntese dos dez mandamentos. Alguém errou nessa interpretação e, por causa dela, muitos já morreram. E agora, José?

Por isso temos de aprender a ler mais os poetas que os exegetas.


essa é boa 3








É verdade que o sapo que freqüenta a igreja da lagoinha "lava o pé "?








FONTE: http://verticontes.blogspot.com





GRAVIDADE – criança feliz

Levi Nauter


GRAVIDADE

A janela abrirá devagarinho:

fará nevoeiro e tu nada verás...

Hás de tocar, a medo, a campanhia

e, silenciosa, a porta se abrirá.

Mário Quintana1




Nesta semana tive, até agora, a melhor notícia já recebeida.

Eu e a Lu, a mulher da minha vida, estamos grávidos. Ainda não fizemos os exames definitivos, por assim dizermos; porém, os realizados indicam aquilo que esperamos há um bom tempo. Um filho ou uma filha está a caminho.

A alegria é indizível. Faltam-me palavras para expressar um sentimento guardado por anos – alguns deles por opção. Quando desconfiamos desse momento, nos abraçamos e a emoção tomou conta. Além disso, ao longo da semana recebi muitos abraços e felicitações, outra novidade pra mim. Nenhuma pessoa me desejou sorte; ninguém disse “criar filhos é difícil”. Apenas sorrisos, apenas alegrias. A vida é maior e compensa qualquer eventual esforço.


Exatamente hoje, 01-09, a Lu completa 36 anos. Há presente melhor que receber um filho ou uma filha? Estamos muito felizes. Se tudo correr bem, em maio será a minha vez de ter como presente o nascimento da criança. Aniversários assim são presentes do maravilhoso e gracioso Deus.


Nossos sentimentos se misturam – o texto parece truncado, não sai da mesmice. Mas a felicidade tem disso: a gente ri, e os assuntos giram em torno da razão da felicidade. Por vezes ficamos apreensivos em como educar uma criança; noutros momentos pensamos que isso será o de menos. Como dar conta de tantos compromissos e ainda atender uma criança que depende da gente? Sei lá, sei apenas que desejamos muito tê-la.


Ficamos imaginando o rosto (com quem será parecida?), o cheirinho. Sentimo-nos – guardadas as devidas proporções – como se fôssemos deuses: estamos fazendo uma mistura de nós dois que resultará numa singularidade: ou no João Vitor ou na Maria Flor. A euforia toma conta.

De minha parte, quero escrever um texto mensal até o seu nascimento, compartilhando os acontecimentos dessa fase. Posso adiantar que também ando enjoando – eu que tanto ria de quem contava histórias parecidas. Também me parece ótimo notar a Lu com algumas sensações estranhas: achando horrível o cheiro do café e de alguns perfumes, entre outras.

Também é minha intenção ser um bom pai. Conversar muito com o filho ou filha. Não intento que a criança tenha medo de mim. Quero dar muitos abraços, muitos beijos, dizer a toda hora que a amo e que ela foi muito desejada.

Depois conto mais.








1 QUINTANA, Mário. Nariz de vidro. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2003.



[as sagradas entrelinhas] - elienai cabral jr.

A pretensão piedosa de muitos cristãos de se apoiarem peremptoriamente no que dizem as Escrituras é no mínimo ingênua. Partem do pressuposto impensado de que há uma compreensão absoluta do que está escrito. Que por sua vez funda-se na idéia de que a verdade seja algo pronto, do lado de lá do pensamento, grafado no texto bíblico, apenas à espera que pessoas dela tomem posse.

A compreensão da verdade pensada assim elimina a mais humana das ações: a interpretação. Somos todos seres de interpretação. Uma vaca não interpreta, apenas reage. Uma pessoa não reage apenas, interpreta. Não há possibilidade de haver uma ação humana sem que também aconteça uma interpretação. Uma verdade nunca está do lado de lá pronta para ser possuída. Toda apreensão de idéias é um movimento impreciso e participativo de interpretação.

As páginas da Bíblia não são gavetas que guardam verdades, mas a coleção de narrativas e dissertações que nos convidam ao aprendizado. Nem seus leitores são desengavetadores inertes e neutros de conteúdos prontos. A Bíblia é um livro forjado com múltiplas interpretações. Desde sua escrita original, traduções e versões, o texto é marcado pela confluência de mentes que dela participaram. Juntamos a isso as teologias, tradições e culturas que têm na Bíblia ao menos uma referência de valor e temos um mundo indeterminado de olhares em suas páginas. Porque simplesmente é impossível à mente humana ler sem interpretar e interpretar sem entrar em conflito com outras e diversas interpretações.

Quem quer que afirme apoiar-se absolutamente no que dizem as Escrituras está na verdade dizendo que se apóia em uma tradição de pensamento e do que dela compreende.

O que chamamos de verdade bíblica é uma miragem. Porque não há possibilidade de existir um conteúdo de afirmações atemporal e universal. Por tudo o que já se disse acima. Ao entrar em contato com uma afirmação coloco em movimento todos os preconceitos, tradições, sentimentos, aspirações do meu tempo, questões da minha época, tudo o que em mim participa do modo como interpreto a vida e as pessoas à minha volta. A verdade é relativa a mim, e tudo o que em mim participa do que compreendo. A verdade é necessariamente provisória. Está sempre em construção.

O que chamo de verdadeiro não é um bloco maciço de idéias, mas um corpo inacabado e dinâmico de perspectivas. As verdades humanas nunca são absolutas, são sempre finitas e processuais. Qualquer outra candidata à verdade que se pretenda completa, universal e insuperável pelo tempo fala uma língua incompreensível à mente humana. Nada comunica. Não nos diz respeito. Nem dela podemos fazer referência. Se nos referimos a uma idéia, interpretamos.

Isso significa que sempre que alguém arroga para si a posse de uma verdade absoluta está de fato absolutizando uma versão, a que prefere os interesses de quem está acomodado ao que prevalece em seu mundo. A história não deixa dúvidas sobre os absurdos já cometidos em nome da posse inquestionável da verdade. Mas certamente o maior dos absurdos é a desumanização de todos que entram em contato com tal pretensão. Na medida em que uma idéia é absolutizada, as pessoas são pulverizadas. Quem sai em defesa da posse da verdade perde o outro de si mesmo, ou seja, a sua própria consciência e suas reivindicações por novas respostas. Perde também o outro além de si, ou seja, tudo e todos ao seu redor que divergem em busca do diálogo.

Quem quiser encontrar a Palavra de Deus e não perder a si mesmo e aos outros sob a prepotência de posse absoluta da verdade precisará ir além do que está escrito. Precisará abrir-se para fundir horizontes. De quem escreveu, da tradição e os de seu tempo. Precisará de modéstia para as alteridades envolvidas no texto. Precisará de compromisso com o seu mundo e suas dores. Precisará de imaginação e delicadeza.

Porque a Palavra de Deus não é a Bíblia, mas as suas entrelinhas.

Elienai Cabral Junior

essa é boa 2

Levi Nauter


É saudável o uso de silicone no seio da igreja?



[estou no meu limite] - ricardo gondim

Sei que existem pessoas sérias entre os evangélicos. Estou consciente de que mais de sete mil profetas ainda não se dobraram a Baal. Não esqueço o nobre testemunho dos que me precederam na militância da fé. Mas sinceramente, não dá...

Não dá para ver o avanço de vigaristas e charlatões prometendo cura divina, prosperidade financeira, solução de problemas conjugais, em troca de ofertas. Não suporto assistir a três minutos de programa de rádio ou de televisão. Sinto náusea com a postura arrogante de falsos profetas que oscilam entre camelôs religiosos e doces professores de Bíblia.

Não dá para lidar com a falta de responsabilidade humana dos fundamentalistas que celebram desastres naturais como sinais inequívocos do pecado ou do fim do mundo. Não tenho mais estômago para ouvir professores de teologia, forjados em seminários de segunda linha, criticando livros que nunca leram ou teólogos que não conseguem citar duas obras. Tenho medo quando discursam na defesa da “reta doutrina”.

Não dá para lidar com a inveja de sacerdotes que voam como abutres à espera de que alguém tropece. O mundo evangélico está repleto de líderes que jamais conseguiriam sobreviver no mundo empresarial, mas vivem de condenar os outros. Preguiçosos e despreparados, adoram praticar tiro ao alvo. Incompetentes, carregam a marca de Caim. Os piores, mimetizam comportamentos moralistas, copiam afirmações heterodoxas e se especializam na defesa das tradições denominacionais.

Não dá para lidar com o ufanismo das falsas onipotências. Na corrida pelos primeiros lugares no Olimpo dos ungidos, sobram narcisistas. Não agüento as empreitadas mundiais, os projetos, as campanhas, que “vão mudar o mundo”. Esses falsos heróis instumentalizam o povo em nome de suas megalomanias. Usam e abusam da boa-fé de quem quer fazer alguma coisa pela humanidade. Só que os recursos doados com sacrifício acabam diluídos na máquina, sugados pela volúpia de poder e investidos em mais propaganda para alardear como são especiais.

Não dá para lidar com a repetição enfadonha de chavões. Cansam as frases prontas, os conceitos batidos e repetidos, que já não transmitem valor algum. A grande maioria dos púlpitos evangélicos é de uma mesmice estupidificante. Os hinos reciclam poesias gastas; os sermões começam e terminam com a promessa de bênção.

Já escrevi que andava cansado com o meio. Já pedi para não ser classificado como “evangélico”. Agora não sei mais o que dizer. Talvez precise continuar batendo na mesma tecla, não dá, não dá, não dá...

Soli Deo Gloria.



Estou contigo nessa, pastor Gondim. Talvez minha vantagem seja eu não ser pastor. Levi Nauter

essa é boa

Levi Nauter




Quem aspira as coisas do alto está limpando o teto de casa?


FONTE: www.verticontes.blogspot.com

[encantada, engasgada, engatada] - levi nauter

Levi Nauter





Durante minhas férias de julho (duas semanas) assisti a um filme no mínimo curioso. Dos estúdios Disney, a história é um conto de fadas na grande metrópole. Giselle é expurgada de seu reino pela malvada rainha. Onde vai parar? Obviamente, como um típico filme norte-americano, cai na Times Square. A partir daí, temos um desfile por belos lugares de Nova York. Um bem apessoado advogado acolhe a menina. Obviamente, também, ela não consegue resistir ao charme do homem.

Mas preciso dar uma dica: não assita ao filme dublado. A música, de estilo caribenho, parece ter sido gravada pela estridente (e chata) voz da Ana Paula Valadão. Era-me bastante irritante ter de ouvir, de quando em quando, o “asim ela sabe que a ama...”. Parecia o tal Diante do Trono. Mas o filme é divertido, nada que o 'subtitle' não resolva. A música – em inglês – torna-se mais audível, machuca menos o ouvido, há menos miação.

No elenco, a princesa é Amy Adams; o advogado, Patrick Dempsey; a malvada é a já velha Susan Sarandon.

Ah, o filme. Chama-se Encantada.



[tipologia cristã 2]

Mais uma do Verticontes, o Wilson T. está demais. Rir não faz mal a ninguém. O texto vem a calhar, acabo de construir e sei o que o texto propõe.



No canteiro de obra:

crente prego-sem-cabeça: edifica, mas não aparece.
crente furadeira: só dá furo e ainda faz muito barulho.
crente metro-de-bambu: útil em áreas de tensão.
crente martelo: pregador por vocação, mas faz estrago quando erra na introdução.
crente martelo-de-borracha: agride, mas não machuca.
crente grifo: aperta, mas não amarra nada.
crente prumo: é bem certinho, mas se pegar no pé de alguém...
crente bucha: segura as pontas, mas abre o bico.
crente lixa: áspero, mas acaba com as farpas maldosas.
crente arame farpado: se você bobear ele puxa teu saco.
crente peroba: pau pra toda obra.
crente trena: vive medindo o outro.
crente serrote: adora uma divisão.
crente andaime: dá apoio, mas é um perigo.
crente prego de aço: não se dobra facilmente, apesar das porradas do pregador.
crente corrente: amarra o pastor.
crente textura: dá jeito em fachadas.
crente betoneira: não deixa a massa parar.
crente guindaste: se orgulha de levar as cargas.
crente cano: vive escondido, mas quando deixa vazar algo dá um broblema...
crente válvula-hidra: limpa a sujeira, mas não apaga a lembrança.
crente tijolo-baiano: todos acham feio, mas são os mais usados.
crente caçamba: é paradão, mas muito útil.
crente chave-de-fenda: penetra nas brechas.
Crente cal virgem: dá um ar de limpeza, mas não resiste muito.
crente pá-de-pedreiro: gosta de alisar as massas... Mas também a joga.





rebanho apostólico - de Volney Faustini

Com a devida autorização, posto um texto bem criativo do Faustini, um cristão que também não se conforma com o que está por aí. Em seu texto não há mera coincidência. Reflitamos.

Para encontrar Faustini, digite: http://volneyf.blogspot.com. Vale a pena!


REBANHO APOSTÓLICO


Preacher: Diga à pessoa do lado: Eu te amo.
Povo: (burburinho) eu te amo ... (burburinho) eu te amo ...
Preacher: Mesmo que voce não conheça quem está ao seu lado, diga eu te amo,
Povo: (burburinho) eu te amo ... (burburinho) eu te amo ...
Preacher: Povo apostólico!
Povo: Amém!!
Preacher: Voces não se deixarão ser levados por ventos de doutrinas estranhas.
Povo: Amém !!
Preacher: Porque vocês são a pérola preciosa - a pérola apostólica!
Povo: Amém ! !
Preacher: Voces não deixarão de ser fiéis, de ser o escolhido, de ser o abençoado.
Povo: Amém ! !
Carinha lá no meio: A L E L U I A.
Preacher: Porque voces tomaram posse. Bata o pé com firmeza no chão - esta é a terra e o tempo que Deus lhe deu. O tempo gente, não o templo.
Povo: (burburinho e batida no chão) [pá, pá, pá] Amém!
Preacher: Voces não se deixarão abater pelas provações apostólicas nem pelas perseguições do inimigo. Vocês e só vocês pisarão na cabeça da serpente.
Povo: (burburinho e batida no chão) [pá, pá, pá] Amém!

Preacher: Não aceitaremos injustiça - mesmo que as provações não tenham explicações ou justificativas plausíveis! Amém?
Povo: Amém ! !
Preacher: Podem se assentar... Vocês são nação apostólica. Repita comigo: Eu sou único, eu sou singular, eu sou um indivíduo!
Povo: Eu sou único, eu sou singular, eu sou um indivíduo!
Preacher: Não me deixarei ser levado por ventos de doutrinas outras.
Povo: Não me deixarei ser levado por ventos de doutrinas outras.
...

Preacher: Agora que terminou a lavagem apóstolica dos meus pés, venham beber dessa água ungida.
Povo: (em fila) glub glub glub
Preacher: Amém ?
Povo: Amé ... cof, cof ... mém



[jesus] - Pedro Luis e a Parede com Ney Matogrosso

Essa é uma obra típica da nossa brasilidade. Viva o povo brasileiro. Viva a arte!

Aristóteles já dizia que deveríamos "brincar para ser sério". De minha parte, penso que a visa sem riso é sem graça.

A composição a seguir é coletiva, de Gustavo Valente, Lucas de Oliveira, Dado, André Passos, Rodrigo Cabelo, Beto Valente E Pedro Luís. O suingue é maravilhoso - essencialmente o contra-tempo muito bem executado pela percussão. As vozes do sempre bom Ney e a bela interpretação poética do Pedro Luís dão o toque magistral para a música. Mas a leitura da poesia também é importante. Leiamos, então, Jesus:


Salve, salve, simpatia!
Dizem que Jesus morreu na cruz
mas eu tive com ele na Dutra, em Queluz
levava na cabeça um tabuleiro de cuscuz
cocada de céu, cocada de luz
cocada de céu, cocada de luz
cocada de céééuuu...

Jesus
Jesus, Jesus
Jesus

Galo cantou
Jesus
Pneu furou
Jesus
Vestibular
Jesus
Atravessar o mar
Moisés
Sobre as ondas com os pés
Jesus
Como Jojó de Olivença
Zulu

No mar da África do Sul
No mar da África do Sul
No mar da África

Jesus, Jesus...

Fazenda do Seu Jesus
Fazenda do céu, Jesus

Tem cachoeira
Fonte de água viva
Também faz sol
Chuva quando precisa
No São Francisco
piracemas de alegria
Belém-Brasília
feijãozinho da Dona Maria.

Jesus, Jesus...

Tatu andou
Jesus
Tatuapé
São Paulo
Bicho pegou
Noé
Bicho de pé
Jesus
Faltou a luz

Jesus, Jesus...

Jesus, Jesus
Vamos tirar Jesus da cruz
Vamos tirar, vamos tirar
Vamos tirar Jesus da cruz

Nós vamos tirar Jesus da cruz
porque o rapaz está pregado
naqueles pedaços de pau
há mais de dois mil anos
Vamos deixar ele com os pés
e as mãos livres
que ele vai pular, dançar
virar cambalhota
e fazer muito melhor.
Mas é muito melhor!

E vai no lombo do cavalo
galopando pelo espaço
Salve a agricultura celeste

Salve a agricultura celeste
(Salve a agricultura celeste)
Salve Jorge, salve simpatia!
(Salve a agricultura celeste)
Salve Mané Garrincha
e Clementina de Jesus
(Salve a agricultura celeste)
Salve Chico Science
e Chico Xavier
(Salve a agricultura celeste)
Salve Raul Seixas
e Chacrinha, o Velho Guerreiro
(Salve a agricultura celeste)
E paz na Terra
a todos os seres
(Salve a agricultura celeste... )


enquanto isso

Levi Nauter

Enquanto curto minhas férias de julho, estou polindo alguns textos, revendo conteúdos para as aulas que ministrarei no segundo semestre, lendo bastante, ouvindo muita música. Amando minha amada Lu e contribuindo - na medida do possível - com os acabamentos da tão sonhada casa.
Porém, enquanto isso, infelizmente, fui 'zapear' os canais de TV e encontrei o que não queria: um programinha (é no mínimo isso que posso chamar para não baixar o calão) de televisão chamado A VERDADE NA TV com o (pseudo) Reverendo João Batista. Dentre as pérolas:
- Venha receber o "pente ungido" nessa grande cruzada.
E o comercial anunciava: "O grande dia da sua vitória está chegando. O reverendo estará na gruta determinando a sua vitória" (anúncio para o Rio de Janeiro). "Nesse dia, pela primeira vez no RJ, estará sendo distribuída a medalha COMIGO NINGUÉM PODE".
É o fim da várzea. É por essas e outras que não me arrependo de ter sumido dos templos. Eles me parecem inúteis. A vida real me é mais interessante, mais lúdica, mais divina.
Pastorada assim tinha que ter vergonha na cara.
Tô fora.

desconfianças

Levi Nauter



Desconfie dos que erguem as palcas nas quais se lê “sou cristão”, ou “administração cristã”, ou “empresa cristã”. Também merecem nossa desconfiança os (pseudo) líderes que se auto-intitulam 'apóstolos', 'bispos', 'profetas', 'reverendos' e até 'pastores'.

Sobretudo, tenham um pé atrás com os que parecem ter consultado alguma numeróloga ou taróloga; afinal, ao serem perguntados pelo nome respondem: “aqui quem está falando é o PASTOR ZEZINHO”. Como assim Pastor Zezinho? O nome não era Zezinho? Sim. Era. Agora fui consagrado. Assim, parece que quando deus 'consagra' ele acrescenta um status.

Não é esse o meu deus.


Pra não dizer que não falei de flores, desconfie também daqueles líderes que não trabalham, mas que, ironicamente, têm um bom estado financeiro. Esse deus já me interessa.


Passe a desconsiderar o deuzinho pobre da mídia. Aquele que cura dor de barriga, dor de cabeça, dedo destroncado, olho roxo e, enquanto isso, deixa problemas muito maiores e relevantes à deriva. Esse tipo de deus também não me interessa.


E o céu?


Ontem caminhava com minha mulher (o 'minha' não significa dominação) e vi algumas mulheres feiamente trajadas (feiamente mesmo!). Todas com a Bíblia na mão (o que, para mim, diz bem pouco). Disse a ela: - se o céu for cheio de gente feia assim o inferno deve ser mais atraente. Ou, quem sabe?, todos sendo anjos as coisas fiquem melhores.


A esperança é a última que morre.

[tipologia cristã] diálogo

Levi Nauter


Um leitor especial andou passando pelo meu blog: Wilson Tonioli. O parceiro tem um interessante blog (www.verticontes.blogspot.com) no qual posta idéia com um bom-humor sem palavras. Foi donde retirei essa “tipologia cristã” - lá com o nome 'Hollywoodianos e afins'. Aproveitei e incluí os comentários do dia, mesmo dessa postagem. Espero não ir para a fogueira nem ser processado pelos fundamentalistas de plantão.


A tipologia é a seguinte:


Crente Walt Disney: sempre tem uma estória pra contar.
Crente Álien: baba quando fala.
Crente Predador: invisível, mas faz um estrago...
Crente Rambo: ninguém agüenta mais suas missões.
Crente Macaulay Culkin: sempre se esquecem dele.
Crente Magaiver: acha solução pra tudo.
Crente Shaekspare: no púlpito é bom em pregar peça.
Crente Richard Gere: faz apelo até às prostitutas.
Crente Johnny Deep: é pirata, mas agrada o público.
Crente Titanic: é profundo, mas ninguém quer embarcar na dele.
Crente Bergman: é “cabeça”, mas nada popular.
Crente Indiana Jones: faz pose de professor certinho, mas adora uma aventura.
Crente Almodóvar: é sempre um problema para os fundamentalistas.
Crente Harry Potter: chegado numa mágica e se sente O escolhido.
Crente homem-aranha: seu maior poder é amarrar os outros.
Crente Sexto Sentido: está morto e não sabe.



Acréscimo a partir dos comentários:

Crente Spilberg: é uma super produção, mas no fundo sabemos que não é lá grande coisa.
Crente M.G.M Studios: é um leão, mas só na tv.
Crente Charlin Chaplin: Faz um grande papel mesmo sem falar nada.

Crente Freddy Krugger: Que te assusta até nos sonhos.
Crente Cinema Brasileiro: Só fala palavrão.
Crente Hitock: Adora fazer Terror e Premonições.


É bem possível ampliarmos essa listagem.
Contribuições são bem-vindas.


[evangelho à força] - levi nauter


Levi Nauter





[evangelho tomado a força] – levi nauter

Encontros fraternos são como sementes. Neles a gente conversa longamente, toma água, chimarrão, café, pastelão, chá, refri, entre outras iguarias. O papo rola solto, despretensioso, desarmado. Ri-se, quase chora-se, conta-se as novidades ou 'velhidades', mas também pode não se falar nada. Um simples abraço fraterno diz tudo. Ocorre que a semente é meio assim: sem grandes pretensões. Porém, de repente, ela cai, brota e pode nascer uma flor ou, no dizer de Gilberto Gil1 (na belíssima Drão), “Morrenasce, trigo, vive morre, pão”.

Aquele bate-papo, aparentemente sem muita importância, vai gerando bifurcações em nosso interior. É como se ele criasse redes internas de assuntos que se checam e coadunam ou se dicotomizam. Foi um pouco do que aconteceu comigo. Obrigado Guto, Camila, Timóteo e Patrícia.


Num certo momento da nossa conversa surgiu um assunto do qual não me orgulho tanto quanto deveria, ou tanto quanto alguns o fazem. Nasci num berço cristão. O detalhe é que nasci num berço fundamentalista, pentecostal. Preferiria ter nascido num berço comum, menos fatalístico, menos repressor, menos desumano. Ter nascido num lar dito cristão, e ainda por cima fundamentalista, não me permitiu ser gente até uma certa data.

Apresentaram-me um Deus carrasco, estraga-prazer. Mostraram-me, na verdade, um escape do inferno. Meu maior desejo era fugir do inferno. Uma vez ouvi uma sermão na qual o preletor dizia “a mim basta ficar em qualquer cantinho, desde que eu esteja no céu”. Um céu assim mais parecerá um inferno.

Desde cedo aprendi o discurso igrejeiro. Ele me aprovava perante a liderança fundamentalista pentecostal. Sabia as palavras de ordem, tanto para cantar quanto para orar no microfone. Sabia quais músicas levavam o povo ao ‘delírio’, ao “céu”. Mas cansei de tudo. Como diria Rita Lee, “me cansei de lero, lero”. Abandonei uma denominação tida como detentora da verdade e do pioneirismo evangélico no Brasil. Fui para uma, digamos, mais light. Ledo engano, havia um legalismo velado, havia a discrepância discurso x prática tanto quanto em outra denominações. Desanimei. Hoje sou um cristão sem igreja. Sou um descongregado. As denominações, na perpetuação da Teologia do Medo, optam por chamar isso de desviado. Não me importo.


Disse isso porque as pessoas que não nasceram num berço fundamentalista não conseguem entender um Deus carrasco, um deus tipo câmera de reality show. Quem não vem desse mundo opressor não compreende a dificuldade que é mudar o conceito de Deus Justiceiro para o Deus Pai. O fundamentalismo conhece o Deus Pau, não o Pai.

Antes de continuar, convido você a ler um trecho da música de Chico Cesar e Vanessa da Mata2, chamada A força que nunca seca:

Já se pode ver ao longe

A senhora com a lata na cabeça

Equilibrando a lata vesga

Mais do que o corpo dita

O que faz o equilíbrio cego

A lata não mostra

O corpo que entorta

Pra lata ficar reta


É exatamente esse o exercício que um ex-fundamentalista faz cotidianamente. A fim de que tudo fique bem se faz uma força para ter esperança. Opta-se por um outro evangelho, um evangelho mais humano (não humanista como alguns gostam de taxar), de mais tete-a-tete com as pessoas. Um evangelho sem dados estatísticos, sem pirotecnias, sem julgamentos (embora com opinião). A lata reta significa estar vivendo (no gerúndio mesmo), lutando contra um evangelho midiático. A lata reta é a capacidade de servir a Cristo, mas em off, sem ninguém ver – a não ser Deus. A lata reta é ser sal e luz fora das quatro paredes igrejeiras; afinal, é fora que interessa.

Mas há algo que a lata não mostra. O corpo se entortando para equilibrá-la. É o evangelho velho querendo tomar o lugar do outro evangelho. O evangelho que se fixa num templo contradizendo o evangelho de Jesus que saía a visitar o submundo. O corpo se entorta para que o evangelho fique mais reto, mais digno, mais abundante. O corpo se entorta porque não há receitas; para viver aventuras com Deus não há script.

A poesia inicia com “se pode ver ao longe” porque esse evangelho não é popular, nem populesco apelativo de multidões. É um evangelho para poucos, para os que não precisam de alguém que os guie como se fossem cegos: vai pra cá, vai pra lá. É para poucos porque não possui ‘sete passos para...’. Não é popular porque Deus brinca de esconde-esconde: está na tempestade, na brisa suave, no ônibus, no trem, no frio aqui do Sul do Brasil. Ele também está na arte escrita, esconde-se por trás das palavras; na poesia de um Neruda; está no reflexo de um Picasso e todo-poderoso numa Tarsila do Amaral. Está na textura de um quadro. Está na sonoridade dos instrumentos musicais.

Se pode ver ao longe porque não tem redes de mídia. Se faz no atelier, na biblioteca, na mente do compositor, do poeta. Sobretudo, está naqueles a quem criou, com tanto afinco, à sua imagem e semelhança. Por isso um bate-papo é semente.

O Deus que eu sirvo é um Deus que se contextualiza e, por isso, agora, é pós-moderno. Por isso não quer guerra; respeita as diferenças e exige isso de mim. O Deus que eu sirvo alivia o fardo e torna o jugo suave. Um evangelho que não faz isso não me interessa. O evangelho que mostra mais o inferno que o céu é um evangelho desgraçado, nele não há Graça.

O Deus que eu sirvo me dá vida em abundância. Não quer que eu tenha medo do amanhã; não quer que eu me sinta acuado pelos medalhões de um evangelho torno, vesgo. Deu-me a oportunidade de conversar com muita gente e reter delas o que é bom.

Só esse evangelho me permite viver em novidade de vida. Dependo completamente de Deus. Ele é a minha força. O resto é o resto.



ILUSTRAÇÃO
Retrato de Pagu, por Di Cavalcanti.In ZATZ, Lia. Pagu. São Paulo Instituto Callis, 2005. Projeto gráfico de Camila Mesquita. Coleção ?A luta de cada um?. P.33.




1Caetano Veloso, no DVD Prenda Minha, interpreta de modo maravilhoso essa música.

2 A Vanessa pôs essa canção no seu primeiro CD. Com Chico Cesar é possível encontrar na coletânea Novo Millenium. As duas interpretações são ótimas, cada um com seu estilo pessoal, o que enriquece a arte.










frases que ouço porque saí da Igreja 7 - levi nauter

Levi Nauter


Cheguei para trabalhar na escola e econtrei o bilhete acima Qual será a intenção da pessoa que o deixou aqui? Correção gramatical? Converter-me? Prefiro achar foi uma brincadeira.

Acho um mau gosto estético o que, de antemão, reflete possivelmente aquilo que se ouve no templo.




Caetano e Cristo - por Mark Carpenter, Ultimato-

Quem pensa que sabe como são os africanos nunca imaginaria que Mia Couto fosse natural do continente negro. O romancista mais celebrado de Moçambique é branco, enche seus livros do realismo mágico da tradição latino-americana e tem um estilo que lembra Guimarães Rosa. Foi contado entre os melhores escritores africanos do século 20.

Em entrevista recente ao Estadão, perguntaram-lhe se há influência brasileira em sua literatura. Respondeu: “Sim. Ela veio justamente da música de Chico, de Caetano. Muitos músicos moçambicanos tinham tentado cantar em português, mas o português duro, rápido, de Portugal, não tinha musicalidade. Aí ouvimos Chico, Caetano, Gil e descobrimos que o português poderia ser outra coisa. Foi uma descoberta.”

Talvez tenha sido crítico demais ao português dos fadistas e trovadores, mas a descoberta de que a língua da mera comunicação corriqueira poderia ser também a língua da poesia e dos sonhos abriu-lhe um novo mundo. Muitos anos mais tarde, o comitê Nobel também reconheceu que a língua portuguesa possui a maleabilidade necessária para ser talhada por alguém com o talento de José Saramago. Aqueles que se importam com os idiomas enxergam na nossa gramática, nos nossos vocábulos e na nossa sintaxe as ferramentas para criar e perpetuar aquilo que só existe na língua. O português pode ser usado para emocionar, agregar e inspirar.

Como cristãos, temos o privilégio de servir e adorar a um Deus literário. A linguagem da Bíblia evidencia sua preocupação com a arte de expressar-se. Há nela não apenas a Verdade Revelada, mas as múltiplas verdades reveladas por meio de uma riqueza estonteante de poemas, acrósticos, canções, parábolas, paralelismos, hipérboles, metáforas, figuras de linguagem e artifícios da retórica. Não resta a menor dúvida de que Deus — o Verbo — se relaciona conosco através da Palavra, e que esta palavra tem forma intencional, bela e artística. Leland Ryken afirma que “os escritores da Bíblia e o próprio Jesus Cristo perceberam que é impossível comunicar a verdade de Deus sem usar os recursos da imaginação. A Bíblia faz muito mais que apenas sancionar o uso da arte. Ela demonstra que a arte é indispensável (“The Imagination as a Means of Grace”, Communiqué, 2003).

Penso, às vezes, que a linguagem usada em muitas igrejas é como o português “duro e rápido” que Mia Couto ouvia quando criança. É utilitária, descritiva e funcional, mas carece do tipo de imagística e musicalidade que despertam a alma. Como pastores e líderes, concentramo-nos no conteúdo de nossas doutrinas em detrimento de sua forma. Esquecemos que a Bíblia não divide a arte em sacra e secular. Nela, a arte possui valor igual tanto em ambientes de louvor quanto do cotidiano (Nm 21.16-18; Is 16.10; 52.8-9).

Como seria se nossos pastores se importassem tanto com a linguagem quanto se importam Chico, Caetano e Gil, assim também como Davi, Salomão e Jesus? Tenho a impressão que, se a poesia de nossas teologias saturasse as nossas palavras, os muitos Mias Coutos das nossas congregações de repente ouviriam algo diferente, algo novo, capaz de agarrar suas imaginações, inspirar-lhes e enviar-lhes correndo de volta à Palavra, fonte de nossa inspiração.


Mark Carpenter é diretor-presidente da Editora Mundo Cristão e mestre em letras modernas pela USP.


Fonte: Revista Ultimato [http://www.ultimato.com.br/?pg=show_artigos&artigo=2102&secMestre=2154&sec=2177&num_edicao=312]




frases que ouço porque saí da Igreja 6 - levi nauter

Levi Nauter



Um pastor dessas modernas megaigrejas neopentecostais, que comecei chamar de "créupentecostais", em programa de rádio, tentando captar a atenção dos ouvintes para uma de suas reuniões 'de vitória'.

- Deus tem uma bênção que vai mudar sua vida. Dues quer que sejamos abençoados, muito abençoados. Ele tem a cura para você. Afinal:
- você já ouviu falar de algum paralítico no céu?
- você já ouviu dizer que um anjo estava com dor de cabeça?


PS: Essa, nem com Xico Xavier dá pra agüentar.

frases que ouço porque saí da Igreja 5 - levi nauter

Levi Nauter


Um homem a quem respeito e de quem muito discordo.

- Olá, senhor! Você não acha a igreja inútil? Afinal, por que ela não está nem aí para as crises nos relacionamentos - pai contra filho, filho contra pai, irmão contra irmão?
- Olha, disse-me o "obreiro", as pessoas só vão à igreja porque têm uma eternidade a enfrentar!

Fiquei pensando que, se assim for, mais inútil ainda ela é. Onde já se viu ser cristão por medo do inferno?

Espero que mais igrejas fechem as portas.

frases que ouço porque saí da Igreja 4 - levi nauter

Levi Nauter


Encontro um rapaz no caminho que me pára e logo diz:
- Muito fui abençoado quando tu cantavas na igreja...
- Ah é? Que bom, fico feliz!
- Onde estás congregando?
- Não estou. Acho que a igreja não me encanta mais.

- Vou orar para Deus te restituir!

Esse é o discurso igrejeiro: quem está fora não presta. Na concepção da Teologia do Medo, o forasteiro está perdendo. Restituir o quê?


[fui ao culto] - levi nauter


Levi Nauter




"Basta que a poesia seja ouvida para que a morte se ponha a correr." Rubem Alves





Há muito não participava de uma 'concentração' iniciando às 18h. Era domingo, o dia estivera maravilhoso e o início da semana deveria ser bem marcado. A casa estava lotada, umas setecentas pessoas alvoroçadas. Havia adoradores e quem ministrava era uma bela mulher, com rara afinação e timbre vocais.

A mensagem era maravilhosa. Um leque de temas incríveis. Bem escrito, fugia do senso comum, daqueles apelos fatalisticos tão comuns no meio atual.

Todas as pessoas ganhavam, na entrada, um esboço com toda a programação. Nele, foto da ministra de louvor e o tema das mensagens. Esqueci de dizer: eram várias mensagens. Incrivelmente, ninguém possuía ar de cansado, de quem quisesse ir embora. Acho que o culto poderia durar mais umas duas horas e ninguém sairia, o que não é tão normal assim.

Todos os fiéis cantavam os louvores euforicamente. Havia choro, muitas palmas, bastante risada, um bom número de silêncio e muito, muito êxtase. Teve até profecia, com nome e tudo. "Você, você", uma rara mescla de simplicidade e profundidade. Foi bênção pura!!!

Essa é a sensação que tenho depois de deixar o belo Theatro São Pedro, onde assisti - com minha amada Lu - a um espetáculo indizível da sempre maravilhosa Mônica Salmaso. Pois, ela estava lançando o CD "Noites de gala, samba na rua", com participação do não menos excelente quinteto Pau Brasil. Um show desses vale cada centavo que se paga.

leia um bom conselho - levi nauter

Levi Nauter
Retomei as sempre ótimas leituras de Gondim. Pois ele está escrevendo uma série de textos intitulados "Mentoria". O último texto vem a calhar exatamente com o que penso sobre a intelectualidade e, por isso, resolvi postá-lo. Os outros podem ser lidos no seu site: www.ricardogondim.com.br.
Falemos de literatura, uma área em que sou leigo, mas um apaixonado. Naquela conversa, eu já havia dito que adoro livros (aliás, muito obrigado pelos antigões que você me deu de presente). Portanto, meu primeiro conselho é simples: leia. Faça da leitura primeiramente uma disciplina; só depois de um tempo de trabalho árduo, você vai gostar e desfrutar de um bom livro.
A mesma regra que aplico na música, uso na literatura. Para mim não existem livros cristãos e livros seculares, apenas livros bons e ruins. Um Dostoievski é bem mais espiritual e teológico do que muitos manuais pragmáticos que os crentes americanos empurram aqui como literatura cristã.

Leia diversificadamente. Biografias, hagiografias, romances, poemas, novelas, contos, tratados filosóficos, teológicos, sociológicos, história universal, história da arte, história das religiões, história da Reforma, história dos jesuítas, tudo me fascina e de tudo tenho sede de saber um pouco mais. Às vezes vou a uma livraria e tenho vontade de sentar-me numa daquelas poltronas e nunca mais sair até que consiga comer cada palavra escondida nos tomos – as paredes do céu estarão recobertas de estantes entupidas de livros.

Leia sempre com uma caneta ou um marcador na mão. Eu posto no meu site frases parágrafos e pequenos textos que me chamaram a atenção. Vou revelar um segredo. Decidi que não postaria no site nada que copiasse da internet ou de livros de citações. Meus livros são rabiscados e sublinhados para que eu me lembre mais tarde do que me chamou a atenção. É verdade, a leitura fica demorada, mas é muito mais produtiva.

O mundo evangélico tem se mostrado bem superficial. Sabe a sensação que tenho quando escuto um pregador americano? "Quem ouviu um, ouviu todos”. A perda dos conteúdos, o empobrecimento da linguagem, a repetição enfadonha dos mesmos argumentos, vem da falta de leitura. A maioria deles lê apenas os seus pares; muitos morrem de medo de se exporem aos questionamentos de “ateus”; quase todos se contentam em “solidificar” o que já sabem. Resultado: o mundo gospel se restringe ao que os gerentes de marketing das editoras decidem como material “bom”. Pergunto a mim mesmo, muitas vezes: “Qual será o futuro de uma geração que forja sua esperança nos livros do Tim LaHaye?”.

Richard Dawkins causou grande alvoroço com um livro que pretendia combater a religião. Acredito que motivado pelo 11 de setembro Dawkins acusa a religião de fomentar intolerância. Porém, quando trata do cristianismo, ele sequer considera os teólogos de peso acadêmico, como Paul Tillich ou Dietrich Bonhoeffer. Dawkins se contenta em bater nas teologias ralas, comercialmente adaptadas, que a mídia popularizou nos Estados Unidos e que nós consumimos acriticamente no Terceiro Mundo. Cheguei a concordar com Dawkins em muitos pontos do seu livro, mesmo divergindo radicalmente de seu ateísmo militante.

Considero que as elaborações teológicas dos evangélicos se descolaram da realidade por falta de leitura. Quando ouço um desses apóstolos alardear que sua oração é “poderosa”, sei que ele é uma alienado. Tenho vontade de convidar essa gente a dar plantão na clínica de reabilitação e fisioterapia que ladeia o meu mestrado. Vejo as ambulâncias trazendo crianças deficientes, muitas carregadas nos braços das mães devido aos espasmos involuntários causados pelas síndromes e nessas horas questiono: “se eles têm tanto poder e são tão santos, não deveriam exercitar a fé deles (a cacofonia é proposital) aqui?”.

Portanto, leia, leia, leia. Permita-me sugerir. Nos romances, devore: tudo de Dostoievski e Tolstoi; “O Conde de Monte Cristo" de Alexandre Dumas; “Os Miseráveis” de Victor Hugo; “O Vermelho e o Negro” de Stendhal; “A Relíquia” de Eça de Queiroz; “Memórias Póstumas de Brás Cubas” de Machado de Assis; “O Quinze” de Rachel de Queiroz; “Vidas Secas” de Graciliano Ramos; “O Eleito” de Thomas Mann; “Ensaio sobre a Cegueira” de José Saramago; “Paula” de Isabel Allende.

Não esqueça da poesia. Fernando Pessoa, com todos os seus heteronômios; Pablo Neruda; Jorge Luis Borges; Vinicius de Moraes (sou apaixonado por sua prosa poética); Carlos Drummond; Clarice Lispector; Mario Quintana. Familiarize-se com o Rubem Alves em suas duas fases. Ele é ao mesmo tempo um teólogo brilhante e um poeta brincalhão; bata os dois no liquidificador e depois beba o sumo de sua teopoética, tão magistral.

Aprenda a apreciar música com letras ricas em nuances de aliteração, rimas e metáforas - Chico Buarque, Djavan e Caetano Veloso são craques.
Com esse fundamento literário, faça a sua teologia, construa a sua percepção. Leia a Bíblia com os olhos de um cidadão do mundo que percebe as angústias, paradoxos e desesperos da humanidade. Quando estudar os clássicos da teologia, sinta-se com liberdade de questionar os seus pressupostos. Para não enrijecer dentro de uma dogmática intolerante, coloque a vida, a riqueza da arte e beleza da criatividade no seu estudo. Não permita que a sua teologia fique presa na torre de marfim dos sectários.

Espero estar ajudando.

Soli Deo Gloria.
Esse conselho serve a cada um de nós. Leiamos!

[descongregado] – levi nauter

Levi nauter
Num dia desses, enquanto curtia meus últimos dias de descanso, num bonito centro de compras encontrei algumas queridas pessoas que não via fazia pelo menos uns quatro anos. Cumprimentamo-nos, alegres, houve uma fraternidade que não se encontra com qualquer pessoa. De repente, uma pergunta desconcertante:
“- Vocês estão congregando aonde?”. “Em lugar nenhum”, respondi, “consideramos que, devido a algumas circunstâncias, o melhor seria ficar de fora, por enquanto”.
Já em casa, comecei a refletir tanto na pergunta quanto na minha resposta. Devo repetir para ratificar que a cena foi-me desconcertante. Sempre que falo com algum cristão-evangélico simpatizante do pentecostalismo ou pertencente a essas ‘igrejolas’ advindas de movimentos pentecostais (pessoas que se rebelaram, saíram de uma denominação e criaram outra nos mesmos moldes) fico esperando alguma pergunta que vá pelo caminho já descrito. Infelizmente, ainda parece ser importante estar ligado a alguma denominação – de preferência uma dessas famosas, com programa em uma rádio AM ou FM ou, melhor será, na TV.
Sinto muito, não atendo a essas exigências. E se depender de mim tão cedo isso não acontecerá. Por isso resolvi escrever sobre minha descongregação.

A minha saída da Assembléia de Deus e da Igreja Batista (CBN) não está atrelada a uma decepção pessoal com alguém; tampouco tem a ver com alguma decepção com Deus. Minha relação com as pessoas sempre foi calcada na racionalidade, no bom senso, no respeito, na responsabilidade, na autonomia alheia e no direito às diferenças. Dos seres humanos nunca esperei mais do que respeito. Quero ser respeitado e ponto, porque é isso que faço. Nisso não há negociação. As pessoas, portanto, sempre me respeitaram; as que agiram diferentes, simplesmente foram ignoradas. Parece-me o único jeito de se viver mais tranquilamente num mundo conturbado. Tenho uma relação respeitosa com todas as pessoas das denominações pelas quais passei. Porque fui músico durante anos, conheço e tenho contato com muitas pessoas, algumas das quais até merecem o título de irmão e irmã.
Minha relação com Deus, então, tem sido cada vez melhor. Ele sempre respeita a decisão de seus filhos, decisão que sempre vem acompanhada das conseqüências – como qualquer outra relação. Talvez o grande diferencial seja a graça divina, incomparável em termos humanos.
Saí da igreja porque ela, nos moldes atuais, não me apetece, não me atrai, não alivia meus fardos nem torna suave meu jugo. Indo a um templo é mais fácil emburrecer. Lá, subestimam minha capacidade de inteligência. Os discursos são sempre os mesmos, os textos bíblicos idem. Esqueceram os evangelhos, se agarram assustadoramente ao que lhes interessa no Antigo e no Novo Testamento. Pedido de dinheiro e falação sobre pecado, pecado e pecado é o que pensam saber. E o pecador e o ‘mão-fechada’ são sempre os fiéis; nunca ouvi um sermão no qual o líder admita que erre, que é pecador. Parecem estar num determinado patamar acima dos fiéis.
A música é pobre, os ministros só sabem imitar. Se há alguma riqueza, ela vem do exterior (em língua inglesa, de preferência) e é empobrecida por pseudotraduções. O sermão é uma tristeza, a oração é ensaiada e os milagres uma aberração. Concordo com o pastor Gondim: “Eles dão a entender que Deus se especializou em curar caroço, dor no braço, mal estar em velhinhas, mas se esqueceu das síndromes de Down, das paralisias cerebrais e das quadriplegias. Sou mortal, finito e bastante pecador, mas posso afirmar que se fosse Deus, com disposição para operar maravilhas, eu escolheria os mais carentes, os mais desamparados, os mais doloridos.”
Nenhuma programação evangélica (pelo menos no Rio Grande do Sul) trabalha com a inteligência. Chacrinha parece até profeta, nada mais se cria, tudo se copia. E a cópia que vale é aquela que, no original, foi escrita em inglês. Inclusive aqueles que protestam. Afinal, quanto artigos já foram escritos que dizem o que Brian McLaren vem dizendo? Ocorre que um vem do norte e os outros são santos de casa. Brian é uma espécie de respaldo para o brasileiro dizer coisas parecidas sem ser rechaçado.
Para se viver bem é melhor desligar-se da igreja. O melhor é ouvir muita música brasileira para buscar a beleza da poesia (claro que isso não está em tudo). Visitar museus, galerias de arte, ir ao teatro, ao cinema. Fazer um almoço, um café ou uma janta com alguns amigos. Namorar bastante, ler muuuuuuiiiiiittto. Curtir a natureza, conversar com o máximo de pessoas possíveis, não se envolver com a política-partidária (embora dela saber o máximo). Orar, cantarolar. Ser honesto, ter vergonha na cara, honrar os compromissos, trabalhar, estudar, meditar, dormir. Não dicotomizar céu e terra, mundo e mundo.
Tento esquecer a igreja, por ora. Há mais o que se fazer de bom. Deus não me ama porque vou à igreja toda semana, todo mês, todo ano. Ele me ama porque assim Lhe aprouve. E como é bom saber-me amado por Ele!!! Nada mais importa.
É fora da igreja que a liberdade existe. É fora dela que a gente vive sob os domínios do Espírito. Não fica aquele líder enchendo: “faça isso, não faça aquilo”. É fora que podemos viver sem receitas. Também é lá que somos confrontados no cotidiano. Num templo, em geral, só há concordâncias; as divergências ficam escondidas, sob panos quentes, disfarçadas de submissão ou cobertura espirituais. Que balela!
A instituição igreja deveria morrer. Enquanto ela existir precisará ser sustentada e nós seremos cerceados e intimidados a sustentar um sistema que move cifras milionárias. O pior vermos ‘profetas’ sem nenhuma timidez pedindo dinheiro (ajuda) ao mesmo tempo em que oferecem seus produtinhos – fruto exatamente do dinheiro alheio. Ou será que toda essa gente já nasceu nadando em dinheiro?
Prefiro o evangelho de Cristo mais interessado no tete-a-tete do que em grandes concentrações de fé (ou feses?).
Cansei de igreja, não de Deus. Este é a razão de eu estar vivo.
Glórias a Deus!

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Maria Flor

Sobre este blog

Para pensar e refletir sobre o cotidiano de um cristianismo que transcende as quatro paredes de um templo.


"Viver é escolher, é arriscar-se a enganar, aceitar o risco de ser culpado, de cometer erros" [Paul Tournier]

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LEVI NAUTER DE MIRA, doutorando em educação (UNISINOS), mestre em educação (UNISINOS) e graduado em Letras-português e literatura (ULBRA). Tenho interesse em livros de filosofia, sociologia, pedagogia e, às vezes, teologia. Sou casado com a Lu Mira, professora de História, e pai da linda Maria Flor. Adoramos filmes e séries.

Leituras

  • textos sobre EDUCAÇÃO (livros, revistas, artigos)
  • PROIBIDA A ENTRADA DE PESSOAS PERFEITAS, de John Burke
  • OS DESAFIOS DA ESCRITA, de Roger Chartier